terça-feira, fevereiro 22, 2005



CANTIGA DOS AÇORES

Santa Maria me valha!
São Miguel me dê conforto!
Como é que eu me fui perder
Dentro de Vila do Porto?
Às vezes a vida dá,
Sem aparente razão,
Mais voltas que um balhador
No Balho da Povoação.

À Santa Cruz me encomendo!
Que foi mulher Graciosa
A Terceira que eu amei
Tão pura como formosa.
Tinha assim uns Olhos Negros
Mas era um pouco Tirana
Hoje morro de Saudade
Entre Maria vai Ana ...

São Jorge não leve a mal!
Não passou de um namorico,
Tão breve como quem vai
Do Faial até ao Pico.
Não sei se lhe mande Flores
Ou se estas farão estorvo.
Este caso está tão negro,
Negro como asa de Corvo

Aníbal Raposo

sexta-feira, fevereiro 18, 2005




BRINDE À AMIZADE

Minha amiga, eu tenho uma cantiga p'ra te dar
Agora que já se acalmou o mar
E a chuva cai lá fora de mansinho
Ergamos uma taça de bom vinho
Que esta fogueira é boa e vai durar

Minha amiga, aceita esta amizade que é discreta
E desculpa os devaneios de um poeta
(Que por sistema é sempre um fingidor)
Acabo de passar além da dor
E de fechar meus sonhos na gaveta

1991
Aníbal Raposo

domingo, fevereiro 06, 2005


O sonho - Pablo Picasso

TEMA PARA MARGARIDA

Ai quem me dera partir
Na canoa da esperança
Ir ancorar noutras praias
Noutros varadouros
Ai quem me dera voltar
A gozar dos tesouros
Da felicidade que eu tinha
Quando era criança

Ai quem me dera ser garça
E voar no canal
Só entre o Pico e o Faial
Me quedar dividida
Ai quem me dera mão firme
No leme da vida
Ai este amor que me mirra
Me mata e faz mal

Ai quem me dera de novo
As certezas e os medos
Ai quem me dera ter credos
E não ser indiferente
Ai o amor passa ao largo
Da vida da gente...
Ai já o tempo se escoa
Como areia entre os dedos...

Aníbal Raposo
(Tema escrito para a personagem que dá pelo nome de Margarida no romance "Mau tempo no canal" de Vitorino Nemésio).