sábado, outubro 29, 2005
FASES DA LUA
Lua nova escuridão
Faz maré de caranguejos
Ninguém sequer adivinha
Que já te cobri de beijos
Que já te cobri de beijos
Ninguém sabe não senhor
Que ao escuro da lua nova
Eu já tive o teu amor
Inda era lua nova
Inda o amor estava quente
Quando ele amadureceu
Já era quarto-crescente
Era já quarto-crescente
E o amor amadureceu
Querendo imitar a lua
Tinha fermento cresceu
Lua cheia, lua cheia
Redonda nem pão de milho
Quem diria lua cheia
Que à tua luz fiz um filho
Que à tua luz fiz um filho
Confesso nunca pensei
Que a essa luz prateada
Pudesse amar como amei
Pudesse amar como amei
(Durou o amor bastante...)
Quando a coisa arrefeceu
Já era quarto-minguante
Era já quarto-minguante
Quando morreu, foi à cova
Mas já tenho novo amor
Que amanha é lua nova
Aníbal Raposo
segunda-feira, outubro 03, 2005
A UM BURRO CIBERNÉTICO
DA COSTA DA CAPARICA
QUE RESPONDE AO NOME
DE TOTAKI TOTAPOLOS
Ele há coisas que acontecem
Que deixam um homem pasmado
Agora até aparecem
Burros em frente ao teclado
Rapazes isto promete
Já ouvi aqui um zurro
Um asno na internet
Não passa dum ciberburro
As árvores genealógicas
De burros faço-as também
“Totó” da parte do pai
“Polos” é mister da mãe
A mãe está desculpada
Nunca me fez mal nenhum
É que uma besta quadrada
Pode parir qualquer um
Isto aqui não há marosca
É como digo maralha
Este burro está com a mosca
Ou então cheira-lhe a palha
Não te vás que é uma perda
És uma besta esforçada
Deve ser de carregar m...
Da Costa ao centro de Almada
1997-02-17
Aníbal Raposo
quarta-feira, setembro 21, 2005
Portrait of Dora Maar
Pablo Picasso (1881-1973/Spanish)
Oil on Canvas
ESTÁTUA DE FOGO
Tu és assim como um luzeiro
Que ilumina a minha noite por inteiro
A nascente d' água da minha fajã
O meu sonho, a minha estrela da manhã
És o araçá mais saboroso
És a ponta de saudade que dá gozo
Como um lenço que me acena à despedida
És o sal com que eu tempero a minha vida
Refrão
Olha p'ra mim! Sou uma estátua a arder
Deitaste-me fogo, vem-me arrefecer
Eu quero voar bem alto, em liberdade
Quem semeia o vento colhe a tempestade
Tu és o mar do meu desejo
És assim o monte do meu Alentejo
Como um sol que morre em sangue no Escalvado
Tens o som duma guitarra no meu fado
Abril de 1995
segunda-feira, setembro 19, 2005
A MÁSCARA
Dêem-nos tempo para pormos a máscara
Perdidos que estamos nas esquinas do medo
Dêem-nos um barco, um leme e uma bússola
E partiremos de manhã cedo
Temos um sol quente
Um céu azul forte
Vamos no mar largo
Abrimos o pano todo ao vento norte
Queremos um quarto forrado de espelhos
Para mirarmos a nossa nudez
Corremos o risco de chegarmos a velhos
Sem nunca sabermos da loucura a lucidez
Sabemos do beijo que roça a carícia
Sabemos da caixa que guarda os segredos
Sabemos da vida, fingida, a malícia
Tocamos na lua com a ponta dos dedos
Maré de Agosto de 1994
sábado, setembro 17, 2005
AMANHECER NA FAJÃ
Que diremos nós os dois quando chegar a madrugada
E as nossas mãos-palavras se quedarem esclarecidas?
Dançarão os nossos corpos como peixes na corrente?
Ensaiarão voos picados de garajaus famintos?
Que diremos a seguir, quando passar a tempestade
E navegarmos tranquilamente no mar de azeite
Dos sentidos? Seremos como milhafres a voar
Com olhos verde-riso que só o nosso amor inventa?
Que caminhos-prata neste mar de breu rompeu a lua?
Quantas carícias trocaremos ao canto dos cagarros?
Que subtis destilados soltarão línguas tão domésticas?
A nossa pequenez na contemplação destes luzeiros...
Bendito seja Deus por me ter vivo
E por me dar a benção de amanhecer contigo na fajã...
Lisboa
2005-09-12
quinta-feira, setembro 15, 2005
sexta-feira, julho 22, 2005
TEMPO AMARGO
Tempo amargo em que as sereias
Já não cantam em nosso mar
Foram ter a outras paragens
Onde encantam no cantar
Verão, estio, tão seco
Dor pungente, tão sentida
Quando entrámos neste beco
Sem saída
Bem te sinto, tão distante
Com os teus passos a meu lado
Há um acorde dissonante
Que entrou no nosso fado
Quem me dá, que bem preciso,
Sugestões, conselhos sábios
Para rasgar só um sorriso
Nos teus lábios
Porque afundas em cuidados?
Onde está tua alegria?
Depois de dias passados
Amanhece um novo dia
Se o nosso amor tem cansaços
Não temas pelo seu futuro
Nos meus braços
Tens sempre um
Porto seguro
Aníbal Raposo
Fevereiro de 2002
sexta-feira, junho 03, 2005
Don Quixote
Picasso
DESENCONTROS
Cheguei do mar da esperança, vim nas velas da saudade
Já passou a tempestade, venho em bonança
Venho avivar o lume que a chama esmorecia
Trazer-te as acendalhas da poesia
Há silêncios que parecem belas peças de oratória
Estão vincados na memória, nunca se esquecem
Até há desencontros que, sem parecerem nada,
São como mil abraços na chegada
Adeus ! Já me vou embora ...
Levo um beijo em cada face
E o desejo que o tempo passe sem demora.
Basta fechar os olhos e tenho a tua imagem.
É a forma de levar-te na viagem ...
Aníbal Raposo
sexta-feira, abril 22, 2005
TALVEZ
Talvez um riso teu, um gesto sábio
Pudesse ser o sol do meu conforto
Talvez tu queiras ser o astrolábio
Que guia a minha nau para bom porto
Talvez no mar irado das tormentas
Talvez no batalhar do dia-a-dia
Tu sejas o planar, com asas lentas
Da garça que adivinha a calmaria
Talvez o melro poise na varanda
Talvez o seu cantar me lance pistas
Talvez eu chegue ao fim desta demanda
Talvez sejas real, talvez existas
Aníbal Raposo
1999
A TUA CHEGADA
Vieste o outro dia
Claro que vieste
Com rumo a Nordeste
E muita alegria
E diz quem te viu
Que vinhas com calma
Para ouvir minh’alma
Que à tua se abriu
P’ra meu grande espanto
Ouviste calada
E p’la madrugada
Já te amava tanto
De manhã, no alvor
E sem embaraço
Selámos num abraço
Promessas de amor
Junto de um carvalho
De sombra cerrada
Abriu-se uma estrada
Do que era um atalho
E então num desejo
Quente de mil sóis
Trocámos os dois
O primeiro beijo
Depois junto ao mar
Entre coisas belas
Contámos estrelas
De noite ao luar
E ouvi tua voz
E também cantava
E a lua brilhava
Somente p’ra nós
No pino do verão
Cruzámos os mares
E ouvimos cantares
À noite, ao serão
Depois do sol-pôr
Dormimos cansados
Corpos fatigados
De brigas de amor
E quis o destino
Que tu me encontrasses
E me transformasses
De novo em menino
Por minha querida
Agora te chamo
E sei que te amo
Mais que à própria vida.
Aníbal Raposo
Lisboa
2003-10-14
quarta-feira, abril 20, 2005
NASCER DE NOVO
Por me teres feito, de novo, correr o sangue nas veias
Pelo baralhar completo das minhas ideias
Pela boleia tranquila p'ró sétimo céu
Faço-te a devida vénia tiro-te o chapéu
Pela frechada certeira que me deu Cupido
Pela ausência da cantiga dita do bandido
No fundo dos teus olhos claros é que me revejo
No meio dos meus sonhos loucos é que te desejo
Oh meu bem, bem sei
Oh meu bem, sei lá
Oh meu bem, ninguém
Sabe o que será
Aníbal Raposo
1990
segunda-feira, março 28, 2005
terça-feira, fevereiro 22, 2005
CANTIGA DOS AÇORES
Santa Maria me valha!
São Miguel me dê conforto!
Como é que eu me fui perder
Dentro de Vila do Porto?
Às vezes a vida dá,
Sem aparente razão,
Mais voltas que um balhador
No Balho da Povoação.
À Santa Cruz me encomendo!
Que foi mulher Graciosa
A Terceira que eu amei
Tão pura como formosa.
Tinha assim uns Olhos Negros
Mas era um pouco Tirana
Hoje morro de Saudade
Entre Maria vai Ana ...
São Jorge não leve a mal!
Não passou de um namorico,
Tão breve como quem vai
Do Faial até ao Pico.
Não sei se lhe mande Flores
Ou se estas farão estorvo.
Este caso está tão negro,
Negro como asa de Corvo
Aníbal Raposo
sexta-feira, fevereiro 18, 2005
BRINDE À AMIZADE
Minha amiga, eu tenho uma cantiga p'ra te dar
Agora que já se acalmou o mar
E a chuva cai lá fora de mansinho
Ergamos uma taça de bom vinho
Que esta fogueira é boa e vai durar
Minha amiga, aceita esta amizade que é discreta
E desculpa os devaneios de um poeta
(Que por sistema é sempre um fingidor)
Acabo de passar além da dor
E de fechar meus sonhos na gaveta
1991
Aníbal Raposo
domingo, fevereiro 06, 2005
O sonho - Pablo Picasso
TEMA PARA MARGARIDA
Ai quem me dera partir
Na canoa da esperança
Ir ancorar noutras praias
Noutros varadouros
Ai quem me dera voltar
A gozar dos tesouros
Da felicidade que eu tinha
Quando era criança
Ai quem me dera ser garça
E voar no canal
Só entre o Pico e o Faial
Me quedar dividida
Ai quem me dera mão firme
No leme da vida
Ai este amor que me mirra
Me mata e faz mal
Ai quem me dera de novo
As certezas e os medos
Ai quem me dera ter credos
E não ser indiferente
Ai o amor passa ao largo
Da vida da gente...
Ai já o tempo se escoa
Como areia entre os dedos...
Aníbal Raposo
(Tema escrito para a personagem que dá pelo nome de Margarida no romance "Mau tempo no canal" de Vitorino Nemésio).
Ai quem me dera partir
Na canoa da esperança
Ir ancorar noutras praias
Noutros varadouros
Ai quem me dera voltar
A gozar dos tesouros
Da felicidade que eu tinha
Quando era criança
Ai quem me dera ser garça
E voar no canal
Só entre o Pico e o Faial
Me quedar dividida
Ai quem me dera mão firme
No leme da vida
Ai este amor que me mirra
Me mata e faz mal
Ai quem me dera de novo
As certezas e os medos
Ai quem me dera ter credos
E não ser indiferente
Ai o amor passa ao largo
Da vida da gente...
Ai já o tempo se escoa
Como areia entre os dedos...
Aníbal Raposo
(Tema escrito para a personagem que dá pelo nome de Margarida no romance "Mau tempo no canal" de Vitorino Nemésio).
quinta-feira, janeiro 13, 2005
Meditation on the harp
Salvador Dali
O QUE ME DÓI EM TI
O que me dói em ti
É esse teu desapego
Esta enorme distância
De estar tão perto
Dói-me tanto esta rotina diária...
Desde que o murro do despertador
Me tira do mundo dos sonhos
Até ao teu beijo gelado de boas-noites
Dói-me cada palavra que gastámos
Na incontornável usura do tempo
Fere-me sempre o muro da tua página de jornal
Na benção de cada domingo
Aníbal Raposo
2000
segunda-feira, janeiro 10, 2005
DESPEDIDA
Como voltar sem te perder nesta viagem?
Como fazer p’ra te matar dentro de mim?
De cada vez que apunhalo a tua imagem
Tinjo o meu peito com meu sangue carmesim...
Como afastar o que nasceu p’ra ser unido?
Como furtar dum céu azul o astro-rei?
Como expulsar a tua voz do meu ouvido?
Como dizer ao coração que cumpra a lei?
Como viver com teu fantasma em minha casa?
Como varrer da minha pele o teu odor?
Como enterrar-te, de uma vez, em campa rasa?
Como é que eu faço? Diz-me tu, oh meu amor...
Lisboa
2003-07-02
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